Cantinho da Leitura

                    Condomínio dos Monstros

Alexandre de Castro Gomes

O Condomínio dos Monstros fica na Rua Mortinho da Silva, número 13. Seus moradores são apavorantes. A criançada do bairro morre de medo de chegar perto do prédio roxo de cinco andares.

Apesar de seu aspecto assustador e do burburinho que se ouve, será igual a todos os outros condomínios? O que será que acontece lá dentro?

- AUAUAUUUUUUUUU!!!

- TUM!TUM!TUM!TUM!

- IÁÁ,HÁ,HÁ,HÁ,HÁ!!!

- CLANC!CLANC!

-CHEEEEEGAAAAA!!!

A Múmia acordou revoltada com o barulho. Interfonou para todos os apartamentos exigindo uma reunião para discutirem o assunto.

- Não é possível! Tenho que dormir 1000 anos, mas não vou conseguir com essa barulheira! Façam o favor de descer para o playground á meia-noite, para discutirmos o problema!

“BLÉM!BLÉM!BLÉM!BLÉM!BLÉM!BLÉM!BLÉM!BLÉM!BLÉM!BLÉM!BLÉM!BLÉM!”O relógio tocou anunciando o começo de uma sexta-feira 13.

Os monstros foram chegando ao playground, onde a Múmia já esperava, com muito sono e mau-humo.

Frankenstein desceu pelas escadas, pois não cabia no elevador.

A mula sem cabeça veio galopando pela porta da garagem. O Saci chegou em um redemoinho de vento. O fantasma atravessou as paredes.

A bruxa entrou voando com a vassoura, junto com o Drácula, transformado em morcego.

Já o lobisomem, o Bicho-Papão e o Esqueleto vieram pelo elevador mesmo.

-Vamos logo com isso, porque hoje é noite de lua cheia- avisou o Drácula.

-...e minha poção está esfriando- resmungou a Bruxa.

-Qual é o problema?- perguntou o Frankenstein com sua voz rouca.

Todos reclamavam. Afinal de contas, Já era meia-noite, e os monstros queriam sair para fazer maldades. Ninguém queria passar a sexta-feira 13 em uma reunião de condomínio.

-Eu tenho várias reclamações a fazer- interrompeu a Múmia batendo na mesa. – Este prédio está muito bagunçado. Aqui ninguém respeita ninguém.

- O que você quer dizer com isso?_ quis saber o Saci.

- Eu quero dizer que andam acontecendo coisas que devem parar de acontecer! Por exemplo, Sr. Saci_ continuou, olhando enviesada para o negrinho travesso. _ Algum moleque por aqui tem a mania de apertar todos os botões do elevador.

O saci deu uma risada e ficou quieto. Nesse momento, o esqueleto pediu a palavra:

- Não acho que eu deva ser criticado. Afinal de contas, nunca incomodei ninguém.

- Pois é , mas o prédio está cheio de ossos que você esquece por aí, emporcalhando o chão – observou a Múmia..

Enquanto isso, o lobisomem se coçava ali num canto, olhando para todos como se fosse um cachorrinho assustado.

- Estão vendo? As pulgas infestam este lugar. Se pelo menos o Lobisomem tomasse um banho de vez em quando...

O Bicho-Papão resmungou  alguma coisa sobre estar ficando tarde para assustar crianças e limpou a baba que escorria pelo queixo.

A Múmia prosseguiu:

-O Frankenstein já nos causou quatro blecautes com suas experiências com eletricidade. A Mula sem cabeça quase botou fogo no prédio. A Bruxa prepara poções fedorentas que deixam nosso edifício cheirando mal.

- Espera aí, ô do trapo. Meus negócios não interferem no dia a dia do nosso condomínio_ interrompeu o Fantasma.

O quêêêêê ? Isso é o que você pensa! e então a Múmia fez sua maior reclamação.

- Pois fique sabendo que o ruído das suas correntes é um dos motivos pelos quais marquei esta reunião

- E continuou:

-Lembrem-se que o limite termina quando começa o do próximo. Estou precisando de silêncio para poder dormir meu sono sagrado de 1000 anos e não consigo. O meu limite termina já foi ultrapassado. Aqui tem barulho por tudo quanto é lado: as correntes, o uivo do lobisomem, os passos pesados do Frankenstein no andar de cima, os gritos que vêm do apartamento do Drácula, o galope da Mula, as gargalhadas da Bruxa, O barulho que faz o vento do redemoinho do Saci, o estalar dos ossos do Esqueleto...

O Drácula, que até então observava a conversa, resolveu se meter no assunto. Tudo aquilo seria resolvido por ele; afinal, quem mais possuía a autoridade de Príncipe das Trevas?

-Sra. Múmia, tenho uma proposta. Acredito que todos estejam querendo resolver isso de uma vez e ir embora. Vamos fazer um acordo, está bem? Se todos nós ficarmos quietos por uma noite, você nos deixará em paz?

A Múmia pensou na proposta. Seu sono era pesado, e se ela adormecesse em silêncio, depois seria mais difícil acordá-la. Estava mesmo precisando dormir e, apesar de saber que fazer acordos com o Drácula é sempre um mau negócio, resolveu concordar. Se todos fizessem silêncio, ela não teria por que incomodá-los mais.

-De acordo!- respondeu entre um bocejo e outro, já pensando em seu sono milenar.

A reunião estava encerrada. Saíram todos correndo para a rua.

Havia dois motivos para ninguém querer ficar em casa na sexta-feira 13: eles precisariam fazer silêncio e aquela deveria ser uma noite de sustos e diversão.

Os monstros voltaram para casa quando o dia estava quase amanhecendo. Ao chegar em seus apartamentos, arrumaram-se para dormir, quando...

-ROOONC!ROOOOONC!

Ninguém conseguiu dormir. A Múmia roncava muito alto; 1000 anos seria muito tempo para aguentar aquele barulho horrível. Foi um desespero.

-Não é possível! Assim não dá!- foram os comentários.

-Vamos fazer outra reunião de condomínio! – decidiu a Bruxa, que sempre fora respeitada por ser a mais velha.

Na noite seguinte, todos, com exceção da Múmia, voltaram ao playground. Os monstros estavam nervosos, com olheiras por um dia maldormido.

-Essa chata reclamou de todo mundo e agora está fazendo todo esse barulho!- resmungou o Fantasma.

-Calma, calma...- pediu o Drácula, que se lembrou: - Ela não disse que o limite termina quando o do outro começa? O acordo com a Múmia foi que ela nos deixasse em paz se fizéssemos silêncio, não é? Nossa parte foi feita. Já que ela não respeitou o combinado, podemos tomar nossas providências.

Os monstros concordaram. O ronco da Múmia incomodava muito.

A quebra do trato lhes permitia tomar uma atitude.

Juntos, planejaram um fim para aquela que perturbava todo mundo. Sugestões foram dadas. Voluntários se apresentaram. Enquanto o Saci e outros monstros saíram para catar os ingredientes necessários, a Bruxa foi arrumar sua cozinha. Esperaram a noite chegar para colocar o plano em prática.

FLAP!FLAP!FLAP!NHÉÉÉÉÉ´!

-“Falta óleo nas dobradiças da janela.”- pensou Drácula, o vampiro, ao voar pela janela da Múmia. Assim que entrou, foi logo abrindo a porta do apartamento para o grandalhão verde.

-Vai lá, Frank. O caixão está no meio da sala. Só tome cuidado com as armadilhas avisou.

-Mmmnmmnmnuhh! – gemeu Frank, que deu uma topada em um taco solto.

– A estopenta podia ao menos criar armadilhas decentes- sussurrou, enquanto colocava o sarcófago em cima do ombro.- Ainda bem que a Bruxa mora neste andar. Subir escadas com isso seria um problema.

-Pssst! Silêncio, Frank. Não fale alto nem balance muito, senão ela acorda e o plano mela- repreendeu o dentuço.

O gigante costurado seguiu até o apartamento da bruxa. Andava com cuidado, Tomando conta para não esbarrar nas paredes. Parecia até que estava carregando um violão caríssimo ou uma prancha de surfe novinha em folha. Chegando lá, colocou o sarcófago em cima de uma bancada, enquanto a velha terminava de misturar os ingredientes de cores e formas estranhas de um caldeirão.

-Aqui no caldeirão, entre gosma de camarão. Se estiver bem cozido, entra pelo de ouvido. Pra a mistura ficar tosca, entre caspa de mosca. Salamaleque! Vai embora, moleque!- a bruxa mergulhou a concha no caldeirão e derramou o líquido em cima do sarcófago.- Dou um grito e te mando para o Egito! UAAAAAAH!-O sarcófago sumiu em uma nuvem de fumaça.

O plano foi um sucesso. Os monstros fizeram uma festança no playground, com direito a bebidas estranhas e quitutes esquisitos. A vida no Condomínio dos Monstros havia finalmente voltado ao normal.

-AUAUAUUUUUUUUU!!!

-TUM!TUM!TUM!TUM!

-IÁÁ,HÁ,HÁ,HÁ,HÁ!!! – CLANC!CLANC!